Proporcional a fama de
maior produtor de grãos e carne bovina, Mato Grosso é também o
estado que mais utiliza agrotóxicos e fertilizantes químicos em
suas lavouras e pastagens. O uso dos agrotóxicos foi tema da
Audiência Pública convocada pelo deputado Ademir Brunetto (PT),
realizada no dia 06 de março, na Assembleia Legislativa de Mato
Grosso (AL/MT). A audiência fez parte das atividades organizadas na
Semana do Dia Internacional da Mulher.
Segundo a coordenadora
do Coletivo de Mulheres do Sintep/MT, Marli keller, o objetivo
audiência foi debate o uso excessivo de agrotóxicos na produção
agrícola de Mato Grosso e o impacto na saúde das mulheres e do meio
ambiente.
Marli keller lembra que
o tema vem sendo amplamente estudado, desde o acidente ambiental
causado pela pulverizações aéreas de agrotóxico que atingiu a
área urbana do município de Lucas do Rio Verde-MT, em março de
2006. “Na época, uma série de reportagens sobre investigação do
crime, a contaminação e os efeitos dos venenos foram realizadas e
desde então tem se intensificado o debate sobre este modelo de
desenvolvimento baseado no agronegócio”, explicou a secretária de
organização sindical do Sintep/MT.
Durante a audiência os
professores e pesquisadores do Núcleo de Estudos Ambientais e Saúde
dos Trabalhadores da Universidade Federal Mato Grosso e do Centro de
Estudos de Saúde do Trabalhador e Ecologia Humana da Fundação
Osvaldo Cruz, sob a coordenação do Dr. Wanderlei Pignati e Dra.
Eliana Dores, ambos da universidade federal e mais dois médicos da
fundação, apresentaram estudos comparando dados epidemiológicos
das regiões do estado com diferentes níveis de utilização de
agrotóxicos.
Nas três regiões do
agronegócio da soja, milho e algodão, há uma incidência três
vezes maior de intoxicação aguda, foram analisadas a urina e o
sangue de professores e moradores das áreas rurais e urbanas das
cidades de Lucas do Rio Verde e Campo Verde, municípios que estão
entre os principais produtores de grãos do estado.
De acordo com o
professor Pignatti foram coletadas amostras de leite de 62 mulheres,
três da zona rural, entre fevereiro e junho de 2010, e a presença
dos resíduos foi detectada em todas elas. As pesquisas indicaram o
aumento da incidência de doenças como má-formação genética,
câncer e problemas respiratórios, especialmente em crianças com
menos de cinco anos de idade. No caso das mulheres, que segundo as
pesquisas são as mais prejudicadas com a intoxicação por
agrotóxicos, agudas e crônicas, acarreta câncer, distúrbios
endócrinos, distúrbios neurológicos e respiratórios, abortos
entre outros problemas.
“Percebemos que onde
a produção é maior, há mais casos de intoxicação aguda, como
diarreia, vômitos, desmaios, mortes, distúrbios cardíacos e
pulmonares, além de doenças subcrônicas que aparecem um mês ou
dois meses depois da exposição, de tipo neurológico e
psiquiátrico, como a depressão. Há agrotóxicos que causam
irritação ocular e auditiva, outros dão lesão neurológica, com
hemiplegia, neurite da coluna neurológica cervical”, destacou o
professor Pignati ressaltando que “para nós da saúde pública não
existe uso seguro de agrotóxico”.
A pesquisa também
apontou resíduos de vários pesticidas nos sedimentos dos rios
pertencentes a bacia hidrográfica do Pantanal.
Outra pesquisa
apresentada pelo Fórum Mato-Grossense de Meio Ambiente e
Desenvolvimento (FORMAD) apontou os impactos causados pela produção
de cana e soja. A coleta de dados da pesquisa foi realizada nos
campos de Barra do Bugres e Lucas do Rio Verde.
De acordo com o
relatório apresentado pelo FORMAD, no caso específico da produção
de cana-de-açúcar, além dos aspectos comuns ao monocultivo, dentro
da Bacia do Alto Paraguai, região excluída no Zoneamento da Cana,
justamente pelos problemas socioambientais causados pelas usinas na
região e que ameaça a preservação do Pantanal, destrói os
padrões culturais das populações tradicionais, que têm laços
estreitos com a natureza. Por exemplo, os Umutinas não conseguem
mais sementes para suas atividades artesanais.
O relatório do FORMAD
apontou um aumento do índice de Hanseníase, pedras na vesícula,
dores de estômago e de cabeça, aumento de doenças de pele e
outras, principalmente nos períodos em que agrotóxicos são
aplicados. Também aumentou o número de abortos espontâneos e bebês
com refluxo e o alto risco de contaminação por agrotóxicos dos
alimentos produzidos e pescados na região.
Outro agravante
apontado nos estudos do FORMAD é em relação a saúde dos
trabalhadores/as que cortaram cana, que tornam-se inválidos, após
12 anos de trabalho. Ainda, os pesquisadores chamam a atenção à
ausência de acompanhamento e estatísticas oficiais sobre problemas
de saúde específicos da região.
Segurança alimentar
Os estudos também
apontam que a expansão da soja nesses municípios ameaça a
segurança alimentar da população, pois vem ocorrendo um processo
de queda do cultivo de produtos importantes na dieta alimentar, como
feijão, milho e algumas frutas. Essa queda, bem acima da média
estadual, regional e nacional, tem ocorrido no mesmo período em que
o monocultivo da soja se expande nesses municípios.
Para Marli keller vale
lembrar que Cuiabá integra o grupo das cinco capitais brasileiras
que não possuem feira de alimentos orgânicos. “Uma produção
agroecológica, somada às práticas de consumo consciente, além de
fortalecer a agricultura familiar, que se contrapõe ao modelo do
agronegócio também forma de desenvolver ações de preservação
ambiental, social e econômica, numa perspectiva de sustentável que
garanta a segurança alimentar”, avalia mencionando o uso de
venenos proibidos no resto do mundo e que ainda são utilizados no
Brasil.
Reivindicação
Um
documento elaborado pelo Comitê Estadual de Campanha Permanente
Contra os Agrotóxicos e Pela Vida, juntamente com os representantes
do Movimento dos Sem Terras e pesquisadores da UFMT solicitou dos
parlamentares apoio e maior comprometimento com o meio ambiente e com
a saúde da população expostas direta ou indiretamente pelos
agrotóxicos.
Carta apresentada à
AL-MT sobre os impactos do uso de agrotóxico
Ao Exmo Sr.
Dep. José Riva
Presidente da
Assembleia Legislativa do Estado de Mato Grosso
Exmo Sr.
Ademir Brunetto
Dep. Estadual
E demais autoridades.
O Comitê Estadual da
Campanha Permanente Contra os Agrotóxicos e Pela Vida, juntamente
com representantes do MST, do FORMAD e pesquisadores da UFMT, vem por
meio desta apresentar nossa preocupação com relação à Saúde e
ao Ambiente do Estado de Mato Grosso devido ao uso dos agrotóxicos
nas lavouras e propor medidas de controle e fiscalização, cobrando
dos senhores deputados estaduais maior comprometimento com o meio
ambiente e com a saúde da população expostas a agrotóxicos.
Um resumo executivo
está anexo a esta carta para sustentar cientificamente os debates
sobre os riscos e malefícios à saúde humana causada pelos
agrotóxicos.
Mato Grosso vem se
destacando como maior produtor nacional de cereais, gado, girassol e
algodão, mas também é o maior consumidor nacional de agrotóxicos.
Porém, esta utilização intensiva de agrotóxicos, seja por avião,
trator ou pulverização manual, leva a poluição dos alimentos, das
águas, do ar, da chuva e consequentemente a contaminação dos
humanos, dos animais e de toda a biota do entorno ou sob influência
das pulverizações.
Esta poluição
ambiental por agrotóxicos expõe e contamina o ser humano,
principalmente o leite materno, o sangue e urina e provoca
intoxicações agudas, distúrbios endócrinos, neurológicos e
mentais, malformações congênitas em recém-nascidos, aumento de
casos e da mortalidade por câncer em mulheres, homens e crianças
nas regionais do estado de maior consumo de agrotóxicos.
Devido às implicações
relacionadas ao uso de agrotóxicos no Estado de Mato Grosso queremos
refletir sobre o atual modelo de produção agropecuário sugerindo
medidas para que a população do estado não continue sendo vítima
dos danos ambientais e agravos à saúde provocados por esse modelo
de processo produtivo agrícola.
Diante do exposto,
elencamos algumas propostas para serem executadas pela Assembleia
Legislativa e respectivas Secretarias Estaduais responsáveis pelas
ações exigidas:
Cumprimento das
legislações sobre produção, registro, revenda e aplicação de
agrotóxicos nas lavouras do estado; Proibir no Mato Grosso, o uso e
aplicação de agrotóxicos proibidos na União Europeia; Implantar
no Estado a Vigilância à Saúde de Populações Expostas a
Agrotóxicos; Implementar no Estado e municípios as ações de
Vigilância em Saúde Ambiental e Saúde do Trabalhador; Implantar em
Cuiabá, um Centro de Atendimento e Laboratório Estadual de
Toxicologia para a saúde dos trabalhadores, poluições ambientais e
populações expostas aos agrotóxicos; Melhoramento da qualidade dos
serviços de registro e de notificações para as intoxicações
agudas e crônicas; Implantar um Sistema de Monitoramento de Resíduos
de agrotóxicos em água potável, no ar, na chuva, no leite materno
dos bancos de leite e nos alimentos; Implantar e monitorar a
qualidade das águas superficiais e subterrâneas nas regiões de
grande produção agrícola e no Pantanal; Incentivos à implantação
de práticas agroecológicas no estado; Cancelar os subsídios dos
impostos fiscais públicos aos agrotóxicos; Proibição de
pulverizações aéreas de agrotóxicos nas lavouras agrícolas do
estado de Mato Grosso; Limitação da aplicação terrestre (trator e
manual) de pulverização de agrotóxicos a uma distância mínima de
500 metros de fontes de água potável, zonas residenciais, criação
de animais, córregos e rios; Proibição do uso de agrotóxicos e
fertilizantes químicos na Bacia do Alto Paraguai (BAP) e principais
afluentes que alimentam a planície do Pantanal; Criar campanhas para
conscientização, orientação, sensibilização da sociedade sobre
a poluição ambiental e alimentar, exposição e contaminação
humana relacionada ao uso de agrotóxicos; Implantar Feiras
Agroecológicas nas cidades sedes dos Polos regionais de Mato Grosso.
Agradecemos a
oportunidade concedida pelo Deputado Ademir Brunetto, que requereu
esta Audiência Pública para debater o uso de agrotóxicos nas
lavouras que impactam na vida das mulheres, homens e crianças e no
ambiente, contribuindo com as comemorações do Dia Internacional da
Mulher e a Semana de Lutas das Mulheres.
Com informações da
Assessoria do Dep. Ademir Bruneto e Centro Burnier
Nenhum comentário:
Postar um comentário